Eram momentos inexplicáveis.
Eu poderia respirar o amor.
Levei-o para detrás de uma casa abandonada que ficava depois do rio.
A casa era velha, feia e um pouco assombrada. Em sua volta, o vento ainda insistia em levar embora aqueles momentos presentes com sua brisa gentil e suave.
Mas nada nos manteria fora do controle. Tudo parecia ser único: eu, ele, a casa, o vento e a escuridão. Porque luz não havia ali. Quer dizer, somente a luz do que sentíamos, a nossa verdadeira relação, o nosso conforto.
E foi ali, detrás da casa velha, feia e um pouco assombrada que sentamos juntos e nos encaramos por alguns instantes. Poderíamos ouvir alguns pássaros cantarolando...
– Bem... – comecei. – Sei que esse não é um bom momento para um primeiro beijo, mas, me sinto preparado. Um pouco preparado. – Suspirei.
– Um pouco? - perguntou-me, cautelosamente. – Eu imaginava que você fosse me levar para um hotel ou algo do tipo assim. – risos. Eu poderia ver algo malicioso em seu olhar.
Ele colocou sua mão em meu ombro e sussurrou palavras de alívio:
– Mas, relaxe. Tudo está indo bem. Eu estou aqui, não estou? – Isso me parecia uma afirmativa.
Ele sorriu, eu sorri.
– Esse lugar me parece confortável. – contra-ataquei. – Eu gosto de lugares isolados, que me deixam sem contato com o mundo. Além do mais, ninguém pode nos ver aqui. – Coloquei minha mão em seu rosto e a deixei deslizar até não sentir mais nada. – Estamos sós.
Ele apertou minha mão. A mesma mão que pus em seu rosto.
Apertou. E parecia não querer soltar. Que aperto! Que gesto mais lindo!
– Eu... – disse-me pausadamente.
Bom, eu esperava um “Eu te amo”, “Eu te quero” ou qualquer coisa relacionada ao “Eu te”. Mas não foi nada disso. Quando me vejo diante desses momentos, sempre acontece o contrário do que eu quero que aconteça.
– Eu quero te pedir uma coisa. – continuou. – Sei que vai soar estranho, mas tenho que admitir...
– Peça! Peça! – apressei-o, curioso.
Curiosidade é de fato, um dos meus piores defeitos.
– Como você já sabe, eu nunca transei com um homem. – disse-me cautelosamente. – E não quero que minha primeira relação amorosa seja aqui, se é que você me entende. – Depois de palavras, respirou fundo e voltou a ser aquele carinha tímido, inocente.
Que coincidência! Eu pensei que ele iria me chamar pra transar ali mesmo.
E isso me trouxe uma paz, uma quietude na alma.
– Eu não te chamei aqui pra isso. – finalizei.
– Me desculpe. – murmurou ele.
– É normal caras como você pensar em transar em ocasiões como esta. – eu disse. – É só trazer pro escuro que vão logo pensando em abrir o zíper e pôr o pau pra fora.
Ele apenas balançou a cabeça e sorriu. Não disse nada.
Enquanto estávamos sentados, o frio parecia nos tomar aos poucos. E que azar o nosso! Não estávamos agasalhados, não tínhamos nada que nos esquentasse. A ideia de ir buscar algo pra fazer uma pequena fogueira foi descartada. Eu não queria nada parecido com os filmes. Nada de beijos à luz de fogueira, nada de coisas românticas. Queria apenas o simples.
Então, com frio, nos abraçamos. Não nos abraçamos forte porque era um frio suportável. Mas mesmo assim, sentimos o calor de nossos corpos ao se juntarem.
– E aí? – ele tomou a iniciativa.
– E aí o que? – fingi que não tinha entendido.
– O que devemos fazer a seguir? – perguntou-me.
– Não sei. – fingi outra vez.
– Eu deveria te... – sussurrou. Sua mão agora estava em meu pescoço. – ...pegar assim... – Eu poderia ver seu rosto mais próximo de mim. Não queria fechar os olhos, não queria perder aquele momento. – ...e te... – Mais perto, mais perto. Fechei os meus olhos. Agora eu poderia sentir sua respiração, seu bafo delicioso de Trident e seus lábios quase beijando os meus. – beijar? – quase não falou. Concluiu. E com um beijo.
Nos beijamos, finalmente. Deveria ter um coro da "Aleluia" do Handel, cantando o tão esperado "Aleluia! Aleluia! Aleluia!", prestigiando-nos naquele momento. Nossos lábios estavam em sintonia total e nossos músculos labiais correspondendo-nos com seu trabalho. Eu quis abrir os olhos, mas preferi ter a imaginação daquilo tudo em minha mente. E que imaginação! Eu nunca iria imaginar que ele tomaria a iniciativa de me beijar. Sempre pensei que se fosse por ele, eu iria ficar ali, boiando, à espera de um beijo. Nunca entendi esses pensamentos machistas, ex-Heteros.
Abracei-o enquanto eu o beijava. E bem forte. Pra ter a certeza de que ele não iria embora, pra o ter mais perto de mim. E ele correspondeu ao meu abraço.
Beijos, abraços. Por segundos, pensei que aquilo tudo não passava de um sonho. Um sonho distante. Me enganei. E feio.
Nos beijamos por uns dois ou mais minutos.
Sim, eu contei em mente.
E agora, eu pude sentir os nossos lábios separando-se um do outro, com calamidade. E sentimento. Voltamos ao início, sentados ali, sem mãos apertadas, sem olhares fixos e sem o frio. O frio nos ajudou a nos aproximarmos um do outro somente para essa ocasião especial:
o beijo. E, como sempre, ele interrompeu o silêncio com suas questões indestrutíveis:
– O que sentiu?
– Seu Trident sabor menta. – eu ri.
– Além disso... – ele também sorriu e insistiu.
– Senti tudo que nunca senti por um garoto. – confessei. – Senti o mundo distante, senti você me amando...
– e não parei. – Senti meu coração bater mais forte enquanto eu estava de olhos fechados. – e concluí.
Ali foi uma verdadeira declaração de amor. Talvez eu tivesse me apressado demais. Mas é melhor nos expressarmos quando achamos que é a hora certa. Eu disse “achamos”. Eu esperava uma resposta, mas ele não disse nada. É normal um ex-Hetero me aparecer com essa reação. Definitivamente, pra ele, isso foi algo perturbador, demoníaco, algo extremamente conturbado, fora do comum. Qualquer resposta seria válida para mim, a não ser essa:
– Legal.
– Achou? – perguntei. Eu entendi sua resposta.
– Sim. Gostei mesmo. Falo sério. – respondeu-me.
Esse “Gostei MESMO. Falo SÉRIO” é algo novo pra mim. Uma mudança, quem sabe?
Continua...
OBSERVAÇÃO:
- O primeiro beijo assombrado é o IV capítulo que faz parte de um conto feito por mim.
Publica logo isso, menino!
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